domingo, 2 de fevereiro de 2014

Dia 3 de fevereiro de 1833



Não há nenhum mestre interior que possa estar no cerne daquilo que se passou. Porque foi demasiado mau, demasiado triste, demasiado doloroso. Não há mestre interior que consiga articular tal perversidade; e ainda que me odiasse profundamente nunca me infligiria tal desastre.

Foi um desastre.

Continuo com a ideia de que foi um sonho. Que sonhei. Negar é uma forma de lidar com a dor.

Eu nunca fugi da dor, minha querida J., sempre me aproximei dela.
E também não tenho medo. Dou a cara, o corpo. Se ela se aproxima, eu submeto-me, mas submeto-me de imediato e com a ideia clara que vou ter de sair dela um dia, para respirar melhor; que um dia ela sairá pelo seu próprio pé ou que terei de ser eu a acompanhá-la à porta e fazê-la ir.
Como vês não me recuso ao sofrimento, nunca o fiz.

Tenho nesta altura, pena.
De mim, sobretudo. Uma enorme pena.
Olho para o meu corpo e vejo-me tão frágil, tão profundamente frágil (se ao menos o mundo todo soubesse e me pudesse consolar).

Tenho consolado o meu próprio corpo. Dou-lhe prazer e deixei de sonhar.

O sonho era simples: eu deitada na minha cama, tinha sido mãe.
Alguém me dava um bebé. O bebé estava morto.
 Morto. Vestido, com o cheiro dos bebés, a roupa bonita e morto. Repetidamente morto e eu repetidamente desesperada.

E sim, isto não é ter um coração partido. É estar a aprender a colá-lo.



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